Alguns dos holandeses deixaram marcas positivas pelo Manchester United, como o caso de Arnold Muhren nos títulos da FA Cup de 1982 e 1985, e Jaap Stam que era um líder em campo na defesa. Porém, poucos até hoje tiveram o mesmo poder e o faro vitorioso como ele: Ruud van Nistelrooy, que hoje completa 40 anos de idade (no mesmo dia que o craque Patrick Kluivert). Um jogador que pode não ser tão citado entre os grandes ídolos que já passaram pelo clube (até devido ao pouco tempo vestindo a camisa), mas foi um dos medalhões fundamentais no processo de rejuvenescimento do elenco, que estava, por um lado, perdendo a identidade aos poucos com as saídas dos remanescentes da tríplice coroa em 1999.
Ruud van Nistelrooy iniciou sua carreira no pequeno Den Bosch da segunda divisão holandesa. Em 1996-97 quando foi o artilheiro do time com 12 gols, chamou a atenção do Heereveen da primeira divisão, e logo acertou com os Frisians. A partir aí, dava seus passos na elite do país, com 13 gols em 31 jogos na estreia, o suficiente para iniciar a trajetória na seleção e atrair atenção do gigante PSV. Com a camisa do clube de Eindhoven entre 98 à 2001, conquistou dois campeonatos nacionais, comandou duas vezes a artilharia e levou dois prêmios de futebolista holandês do ano, sendo o grande atacante dos Boeren desde a saída de Ronaldo Fenômeno. Após 75 gols em 91 jogos, se transferiu para o United pela bagatela de 19 milhões de libras em 2001, com o peso de substituir Teddy Sheringham, que retornava ao antigo Tottenham, e aumentar na produtividade de tentos, que estava em declínio por parte da dupla Yorke e Cole.
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A temporada de 2001-02 apesar de ter sido abaixo do esperado, sem Ferguson e sua turma levantar sequer uma taça, por outro lado foi arrasadora para a evolução de Van Nistelrooy, que marcou 36 gols em 49 jogos, incluindo um hat-trick na goleada contra o Southampton por 6 a 1 no dia 22 de dezembro. Na frente de Solskjær (25) e Beckham (16 tentos), o camisa 10 de 26 anos ainda aguardava seu auge na temporada seguinte. Mesmo não ter jogado a Euro de 2000 e de ter se classificado para a copa de 2002 com a Holanda, Van Nistelrooy não deixou de aparecer para o mundo como um dos melhores atacantes na época.
Com três hat-trick na Premier League, incluindo dois tentos na goleada sensacional contra o Liverpool por 4 a 0, o holandês não só ajudou a conquistar o campeonato, mas instalou o recorde de gols em 10 jogos consecutivos (vale lembrar que os dois jogos restantes foram nas rodadas de estreia na temporada seguinte). Hegemonia esta quebrada só 12 anos depois com Jamie Vardy pelo Leicester City. Por fim, Nistelrooy terminou no topo da artilharia com 25 gols, um a mais que Thierry Henry, e em toda a temporada marcou 44 tentos em 52 jogos, próximo da média de 1 gol por partida. Por pouco não conseguiu bater o recordista Denis Law (que até hoje ninguém deteve sua incrível marca de 46 gols em um ano).
Um artilheiro nato, oportunista de classe. Quando se ia para o Teatro dos Sonhos ver o holandês, era quase certo vê-lo balançar as redes, enquanto a torcida clamava pelo seu primeiro nome como um rugido de leão. Leão este que tinha um nome: Ruud van Nistelrooy. Fazendo a festa dos que estavam em volta e nunca duvidavam da capacidade do camisa 10, e tirando cada sorriso do rosto de Sir Alex Ferguson. Tendo seus predicados justamente reconhecidos, sendo premiado de todas as maneiras possíveis. Mas não parava por aí. Apesar da jornada 2003-2004 ter sido abaixo da anterior, como terceiro colocado na Premier League, os Red Devils de Scholes, Giggs, dos irmãos Neville e do prodígio Cristiano Ronaldo, caminhava de forma impecável na FA Cup: derrotaram os rivais Manchester City e Arsenal, e encontraram na final o Millwall, que nunca havia ido tão longe no torneio mata-mata tradicional.
Na ocasião em pleno Millenium Stadium para pouco mais de 70 mil espectadores, Ruud van Nistelrooy voltou a se destacar como nunca, em paralelo com grande contribuição de Ryan Giggs: primeiro sofrendo o pênalti que o holandês bateu sem chances para o goleiro do Millwall impedir, segundo ao arrematar o cruzamento rasteiro do galês, onde novamente o camisa 10 empurrou para as redes, e registrou ‘oportunismo’ no seu sobrenome que garantiu o 12º título do United depois de cinco anos, com a maestria e determinismo do artilheiro que encerrou a campanha com 30 gols, em 44 jogos.
“Ruud acha que, se ele não marcar, ele não está contribuindo,” disse Ferguson em 2004. “Eu tenho falado com ele sobre isso e, quando ele não marca, ele fica com raiva dele mesmo e se coloca para baixo.” Um pouco abaixo da temporada anterior? Sim, mas não esconde o fato da entrega do holandês em campo. Desse seu lado perfeccionista de querer se manter em alta sempre, e se chatear quando erra por um triz, como o professor revelou. E isso não só deve ser lembrado e aplaudido de pé pelos torcedores, mas principalmente para servir de exemplo a todos os profissionais que compõem o elenco do United. Exemplo este que vale ser seguido independente da função em campo. Do atacante que nunca precisou vestir a braçadeira para comandar momentos gloriosos do clube, que se reconstruía com o envelhecimento da geração dos anos 90, e voltou a ascensão graças à Ruud van Nistelrooy, um dos espelhos de Wayne Rooney, que ajudou a moldar o caráter do sucessor do número 10 tanto na liderança, como sendo um dos perfis que os adversários mais temem durante os 90 minutos.
Depois da temporada 2004-05 sem levantar título, o atacante deixou o United após 219 jogos e 150 gols, rumo aos galáticos do Real Madrid do antigo amigo David Beckham. E assim encerrou o vínculo de um dos maiores jogadores da história. Enquanto o clube voltou anos depois a conquistar mais de tudo, novamente, graças ao impulso de Van Nistelrooy e sua influência vencedora absorvida tanto pelos veteranos Scholes e Giggs, aos jovens Ronaldo e Rooney, quanto aos compatriotas Edwin van der Sar e Robin van Persie, que mais tarde vieram e fortaleceram a imagem da Holanda no Manchester United. Obrigado por tudo, Ruud van Nistelrooy.