Eu devo ser o colunista mais recentemente “contratado” pelo manutdbr.com e, possivelmente, o mais paciente nas janelas de transferências. Ainda assim, não saio incólume da tortura que é esperar até que Ed Woodward conclua uma negociação, para que os Glazers abram a carteira ou para que Matt Judge alinhe todas as exigências de todas as partes em um contrato sólido.
Bom, se você não sabe quem é Matt Judge, deixa eu te informar: ele é o cara que deixa tudo pronto para “Tio Ed, o Sovina” assinar. E Tio Ed só assina depois que falar com os Glazers. Esse é o primeiro problema de uma janela que já era calamitosa antes de começar: a falta de um diretor de futebol. Os Glazers controlam o Manchester United com uma estrutura hierárquica que, dia após dia, parece cada vez menos esportiva e cada vez mais corporativa. Somos cada vez menos “clube” e cada vez mais “empresa”.
…e Tio Ed só assina depois que falar com os Glazers…
Este é um tema que eu não domino, mas, por já ter trabalhado em uma multinacional, conheço com certa profundidade. Também já assinei contratos de serviço e, para que eles se tornassem efetivos, tive que passar por mais de um setor da empresa. No United, muito desse trâmite seria economizado com um diretor de futebol, mas, até agora, nada de alguém segurar este bastão pelos Red Devils.
Enquanto isto não ocorre, a calamidade prenunciada torna-se mais concreta a cada nova janela. Há cada vez mais frustração por parte dos torcedores. Por Deus, há frustração por parte de gente maior que nós! Há frustração dos jornalistas, dos comentaristas, dos ex-jogadores (Ferdinand é talvez o que mais verbaliza esse sentimento) e até do treinador.
Não se enganem: Ole anda muito frustrado. É nítido toda vez que ele tem que responder sobre transferências. O primeiro ato é olhar para baixo e torcer a boca. O segundo é falar o que ele precisa falar para não se comprometer: “pandemia… janela complicada… precisamos das pessoas certas… o outro time às vezes não quer vender…”
Desculpas montadas, sim, sabemos. Mas, será que tudo é frustração e decepção para Ole Gunnar Solskjaer? Para a torcida? Para os ex-jogadores?
Apesar do que se pensa no Brasil, a resposta é: não. OGS está, de fato, feliz com o time que montou até agora e gostaria de acelerar as mudanças que precisa fazer, mas ele é o primeiro a recusar diversas propostas que vêm de cima para baixo – da diretoria até ele. Há jogadores que ele não vê se encaixando no time e, para saber se há um encaixe ou não, ele se debruça com sua equipe técnica sobre uma maçaroca de dados inimaginável. São informações sobre quilômetros percorridos, velocidade média, altura, peso, nacionalidade, idade, clube atual, liga atual, histórico de lesões, passes certos, chances criadas, interceptações etc. Se vc assistiu ao filme “Moneyball – O Homem que Mudou o Jogo”, com Brad Pitt, sabe do que estou falando.
Resumindo: OGS está feliz com os avanços do time, gosta bastante de muitos dos jogadores, mas quer continuar a reconstrução e está frustrado com a morosidade da diretoria para fechar contratos. Por outro lado, os contratos fáceis (como era o de Bale e de Thiago Alcântara, oferecidos pela diretoria a ele) não servem em seu plano de reconstrução. Nem Bale, nem Thiago jamais estiveram em seus planos.
Então, temos dois problemas hoje: a falta de de um diretor de futebol e as peculiaridades de um treinador com um plano na cabeça: um tipo exato de jogador. Jovem, faminto e com poder de liderança. Isto, como ele mesmo disse em entrevista recente, diminui imensamente as suas escolhas.
Quando o United pagou o que pagou por Harry Maguire e Aaron Wan-Bissaka, foi por eles se enquadrarem exatamente no perfil que ele buscava. Um lateral extremamente defensivo. Um zagueiro excelente no jogo aéreo. Mais que isso: ambos britânicos. Foram caros? Foram! Maguire, então, nem se fala… Mas o clube acredita na proposta do treinador. E a proposta nos classificou para a Champions League, que foi o objetivo traçado pela diretoria.
Para irritar ainda mais a todos os torcedores, as desculpas de OGS são ensaiadas, mas não são todas mentirosas. Muitas vezes o alvo é identificado, mas o clube não quer vender. Já é a segunda janela na qual tentamos trazer Sancho. Talvez terceira. O Borussia não quer vender – e com razão! Sancho e Mbappe são os melhores jogadores no mundo hoje na sua faixa etária! São possíveis e prováveis ganhadores da Bola de Ouro. Se Mbappe custou €145 milhões, Sancho vale, sim, pelo menos €120.
Bom, acho que dei vários motivos para o leitor se enfurecer com estes problemas todas, mas, calma… Há uma linha prateada ao redor das nuvens negras: o United está jogando duro, mas deve trazer, até o fim da janela, dois jogadores ainda: um lateral esquerda canhoto e um ala direita criativo e prolífico.
O único motivo para que Sergio Reguilón não tenha vestido nossa camisa foi a tenebrosa “cláusula Betis”, assim apelidada pelo colega de redação Alexandre Perin. Uma cláusula de recompra pelo menos preço – incluindo uma de primeira-recusa – imposta pelo Real Madrid, detentor dos direitos deste lateral esquerdo. O apelido da cláusula é “Betis” porque só times pequenos como o Betis aceitariam pagar pelo jogador, mas ter que vendê-lo de volta pelo mesmo valor quando o Real Madrid bem entendesse!
Do que adianta montar uma lateral esquerda, se o Real pode desmontá-la quando quiser?
Então, apesar de Reguilón parecer do Tottenham agora, meus jovens, se o brasileiro Marcelo morrer em um acidente de carro amanhã (Deus o livre!), O Tottenham já perde Reguilón na janela seguinte. Reguilón voltará ao Real quando o Real julgar necessário. Pior: Bale é um tapa-buracos no Tottenham, já que assinou um contrato de empréstimo por apenas um ano. O Tottenham, amigos, tem os reforços, mas não tem os jogadores.
O plano, agora, até o fechamento da janela, é trazer um lateral esquerdo – afirmação feita com veemência pelo “guru das transferências” Fabrizio Romano. Tudo aponta para Alex Telles, mas, segundo o próprio Romano, OGS e a diretoria gostariam de adquirir alguém mais novo e que não disputasse a titularidade de imediato com Shaw. Fontes duvidosas apontam para um jovem jogador russo que preenche os pré-requisitos do clube, mas, até agora, isto não passa de especulação.
Como eu disse lá em cima: OGS tem um perfil muito específico de jogador e, às vezes, os donos do jogador não querem vendê-lo.
Para concluir esta análise com pitadas de opinião (ou opinião com pitadas de análise), vai aí uma arriscada previsão: Jadon Sancho chega até o fim da janela.
Quem nos assiste no YouTube sabe que tanto Ronan Quadros (que faz nosso programa “ManUtdBR News”), quanto eu (Bruno Coelho) já afirmamos que há £150 milhões de libras disponíveis para transferências (grande parte vinda de um empréstimo feito ainda em maio) pelos Glazers. Este dinheiro acabou ficando dividido da seguinte forma:
Van de Beek foi a única contratação do United nesta temporada até agora
A estrutura do contrato ainda é um problema e o United está tentando encontrar a solução que o desonera menos de imediato – afinal, a pandemia ainda não passou. Esta é a afirmação de duas das mais fortes e seguras fontes sobre o Manchester United: Fabrizio Romano e Duncan Castles.
Duncan faz o podcast “The Transfer Window” com o escocês Ian McGarry, que tem mais de 25 anos de análise do futebol escocês. McGarry, inclusive, disse em um episódio muito recente que “apenas uma sequência catastrófica de eventos faria ruir as negociações do Manchester United por Jadon Sancho a esta altura”.
Fabrizio Romano já deve dispensar apresentações, mas vale salientar que ele também começou um podcast. Chamado de “Here We Go”, ele ainda está nos primeiros episódios.
Sobre futebol inglês e, principalmente, sobre o Manchester United, não há fontes mais sólidas.
Para encerrar, uma lembrança: o United comprou Aaron Wan-Bissaka, Harry Maguire, Daniel James, Bruno Fernandes e Donnie van de Beek a pedido de OGS (além de pegar Ighalo emprestado e trazer de volta Dean Henderson) em três janelas.
Nós até podemos dizer que Woodward, Judge e Glazers tardam. Mas realmente podemos dizer que eles falham?
Até dia 05 de outubro, não. Ainda não!
Bruno Coelho
Bruno Coelho é professor, tradutor e intérprete de Língua Inglesa desde 1999. Nascido em Belém do Pará, morou em 5 capitais brasileiras e hoje reside em São Luís do Maranhão, onde é servidor público e fã incondicional dos Red Devils.
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